Os transtornos alimentares em homens são mascarados

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Falar sobre os transtornos alimentares em homens é necessário. O que vem na sua cabeça quando pensa sobre um homem que tem bulimia ou anorexia nervosa?

Normalmente, no mínimo, você sentirá uma estranheza. É que, na nossa sociedade, transtorno alimentar “é coisa de mulher”. Mas acontece que essas doenças não tem gênero. E se já é difícil para uma mulher procurar ajuda adequada, para o homem é quase como negar a sua masculinidade, negar a si mesmo.

Transtornos alimentares em homens é um tabu

De fato, o machismo é democrático. Ele atrapalha - mesmo que em diferentes níveis - a vida de todo mundo.

No caso dos homens, proíbe-os de ter emoções. Diz a eles que sofrer não é uma opção e que devem trancar seus sentimentos no potinho e não abrir nem sob tortura.

O que acontece?

Homens lidam com suas frustrações com agressão. Não pedem socorro e repelem qualquer sentimento.

Não é à toa que são eles os que mais matam e mais morrem todos os dias. São a maioria na taxa de suicídio e abuso de substâncias.

As doenças com as quais lido estão cobertas de vergonha.

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O que escondemos atrás das máscaras?

Não se foi o vírus, a quarentena, a máscara ou meus pacientes e seus desafios dos últimos 3 meses… Provavelmente o conjunto disso tudo que me fez prestar mais atenção aos olhares.

Saí na rua e percebi o óbvio.

A máscara que protege do vírus me faz pensar em todas as outras máscaras.

O mundo que vivemos se alimenta da nossa frustração estética. Ficamos tristes porque não parecemos tão perfeitos quanto nossos ídolos no instagram e gastamos centenas com procedimentos, cirurgias, maquiagem, filtros.

E o que seria tudo isso, senão uma diversidade de máscaras?

Não estou aqui julgando, muitas delas também uso, adoro. Minha intenção não é causar culpa, mas entender quantas vezes usamos com consciência e quantas vezes estamos negando a nós mesmos

Quanto de nós está preso no que o mundo espera da gente - quanto é máscara - e quanto de nós resiste apesar delas?

Quando quis tirar a máscara, estava pegada à cara
— Fernando Pessoa

Ao sair na rua, é inevitável pensar no conforto que é estar protegido. Não só do vírus, mas do julgamento bobo das nossas imperfeições.

E qualquer máscara ensina sobre o motivo a que veio. A proteção de pano escancara nosso desequilíbrio, irresponsabilidade ambiental e desajustes sociais.

O que dirá de nós as outras máscaras também?

Os transtornos alimentares em homens muitas vezes passam desapercebidos, são sufocados pelas máscaras que a sociedade impõe.

Sorri para o atendente, mas ele nem viu. Me sinto impelida a fazer mais, para que ele leia meu sorriso também nas atitudes. Com a comunicação meio atrapalhada, ainda resta o que está descoberto, o olhar.

São tão mais interessantes que todo o resto. Talvez, a crise também sirva para isso: ressaltar o que realmente importa.

No mundo e em nós mesmos.

É possível vencer os estigmas para buscar ajuda

Como transtornos alimentares foram estigmatizadas como “frescura”, o caminho de um cara até um consultório como o meu é quase impossível. E escondidos atrás das máscaras da masculinidade, os transtornos alimentares em homens cresce de forma silenciosa.

Aposto que você conhece alguém que se acha forte demais para ir ao médico. E talvez você saiba que essa resistência pode ter um final desastroso.

Por isso, vamos combinar assim.

Se você acha que um homem não pode ter transtorno alimentar, você tem um problema.

Homens não são mais simples do que as mulheres. São seres tão complexos quanto. Precisamos rasgar a ​camisa de força que criamos no universo masculino para diminuir o sofrimento de todos os seres humanos.

Essa não é uma conversa fácil. Mas começa por entender que “homens não c​h​oram” é uma música dos anos oitenta e n​ã​o algo que você tem que repetir por aí, mesmo que em pensamento.

Homem pode chorar, pode ficar doente, pode buscar ajuda e pode se amar. Você não é obrigado a usar uma máscara que te machuca e sufoca.

Gostou do texto? Eu tenho um olhar gentil para a nutrição e no tratamento de transtornos alimentares. Se quiser me conhecer melhor, entre em contato.