Positividade tóxica: uma pedra no caminho do amor próprio
Positividade? Adoro “good vibes”. Sou dessas que prefiro botar para cima, quem me conhece sabe. Mas precisamos falar da positividade sem limites.
Primeiro, esse novo mundo completamente eficiente. Carros que andam sozinhos. Aspiradores de pó independentes. Cidades sustentáveis.
Não me leve a mal, tudo isso é massa. Mas esqueceram de dizer que nós ainda continuamos humanos. Pele, osso, celulite. Sem falar da mente. Coitada.
Dizem que não usamos toda sua capacidade e toma Ritalina para gerar eficiência. Para o corpo, academias 24h e dietas malucas. Para o desvio de foco, pílulas. E por aí vai.
Positividade tem limite para você?
Distorceram o ditado “só não tem remédio para morte” e criaram remédio para tudo. É como se nosso corpo e mente precisassem acompanhar a eficiência do mundo moderno.
Mas a mente é cíclica. Traz raiva, angústia, medo, dor, tristeza, porque tudo isso é importante (fora que o mundo não tá nada fácil para a conseguir estar feliz o tempo inteiro). Ao contrário das máquinas, nossa eficiência precisa conviver com a introspecção, o luto, a amargura, os erros.
No entanto, a ditadura da positividade está em toda parte. E é difícil entender como ela pode ser danosa, afinal aparece toda bonitona com suas teorias motivadoras. Frases de efeito, livros de autoajuda, coach gritando através da tela do celular: seja sua melhor versão. Se mexa, reinvente-se, pense fora da caixa.
Positividade não é ruim, tá? É ótima. Mas desde o momento que ela se tornou um extremo, tornou-se perigosa. Criou um débito com todos nós.
Porque NINGUÉM consegue ser 100% o tempo inteiro. E para aqueles que vivem correndo de sensações ditas “ruins” e numa caça constante das suas imperfeições: uma hora a casa cai.
O corpo adoece. A mente padece.
Aprenda a respeitar quem você é aqui e agora
Nossa cultura nos ensinou a cuidar do outro e não de si mesmo. Muitos de nós não têm sequer repertório, não sabe por onde começar. Não há como negar que estamos imersos nesse arcabouço de crenças, valores e códigos de conduta que tanto poder tem sobre nós, determinando, muitas vezes, a forma como nos percebemos e nos tratamos.
Também teremos mais chances de amar nossas singularidades se formos capazes de deixar para trás o vício da comparação e no fiar pelo aval do ser amoroso que nos habita. É quando passamos a ter clareza do que precisamos aprimorar em nós, mas, acima de tudo, a nos apreciar e respeitar do jeitinho que somos aqui e agora.
A verdade é que nos fortalecemos no amor que sentimos brotar dentro da gente. É ele que nos permite manejar os desafios, acolher a pluralidade de sentimento que nos visitam, olhar com amorosidade para a nossa história, acomodar com humildade a imperfeição que nos torna HUMANOS.
Enfim, reconhecer nosso valor intrínseco como corajosos viventes desse grande mistério que nos surpreende a todo momento. Tudo o que mora dentro de nós precisa ser olhado, cuidado, reconhecido, validado em uma postura de abertura, e não de ressentimento ou de crítica. Levar carinho para tudo o que mora dentro da nossa pele. Nossas emoções, pensamentos, dores do corpo e da alma, memórias, sonhos.
Ame-se por inteiro
O desafio - que, aliás, pode ser uma jornada das mais interessantes - está em amar tanto as partes boas quanto as partes que não tão boas que fazem da gente o que a gente é. Amar a casca e o que está dentro dela.
Você pode ativar o mecanismo cerebral ligado à sensação de aconchego e segurança. Uma vez alimentado, ele permite que, em face do medo e das adversidades, possamos levar a mão ao peito e nos acalmar, nos aconchegar com candura.
Que a gente consiga, em algum lugar, amaciar o trato, abrandar a voz, olhar-se com ternura. O amor por si é o amor pelo outro, espelhado. Acontece que só quem se torna responsável pelas próprias escolhas pode se tratar de forma compassiva. Amar a si mesmo envolve assumir responsabilidade.
A positividade tóxica fere nossa alegria de viver
A epidemia de transtornos alimentares e mentais, compulsões e distúrbios tem TUDO a ver com isso. Posso comprovar todos os dias.
Nossa melhor versão inclui o que consideramos positivo e negativo. Fuja de extremos. 100% é coisa de máquina. E, você, se tá lendo isso, é feito de sangue - eita privilégio.
Se você viver para atingir todas as suas expectativas positivas, quanto mais altas elas forem, mais fácil será de você acabar não se reconhecendo no espelho.
“A vida meio cinza”.
É assim que muitas pessoas que atendo veem o mundo. Porque, de fato, tem momentos que a vida fica acinzentada. Seja porque algo ruim aconteceu, ou porque já estava escrito que aquela mente veria o mundo dessa forma.
Existe outro jeito de colorir a vidaO cinza traz a sensação de ausência de emoção, falta de movimento e enfado.
Comumente associada a um quadro depressivo, aparece com frequência em transtornos alimentares. Os seus tratamentos devem ser acompanhados de psiquiatras e psicólogos.
Mas credito também que o poder dos alimentos ajuda no processo. Você já reparou nas suas cores? Alerta: contém cura e também poesia.
Tome como exemplo as comidas vermelhas. Elas carregam consigo a força vital. O tomate maduro é vida. O morango, tesão. A maçã é quase um coração, lembra o amor. E quer algo mais “sexy” do que uma cereja?
Os amarelos nos deixam fortes. Banana, abacaxi, milho... Pode trazer um pouquinho e me chamar para jogar bola.
A cor laranja, dizem por aí, emana otimismo e bom-humor. É verdade, nunca vi um suco de laranja desencorajador.
Tem alimento que traz as cores da esperança, porque nos renovam e deixam nossas manhãs mais verdinhas. Espinafre, brócolis, couve-folha, kiwi. Toma um suco verde, bota Gil pra cantar na radiola e vê se o futuro já não soa mais animador?
Os roxinhos nos deixam mais jovens (da cabeça mesmo, tá?). Ameixa, uva, jabuticaba. Tem ou não gosto de criança em busca de aventura?
É preciso encontrar e ver as cores. Observar onde começa o amarelo e onde termina o rosa de uma manga recém caída da mangueira.
O marrom-escuro de um brigadeiro feito a quatro mãos.
O sorriso gentil de uma macaxeira que se colore dentro da água.
Rosa salmão. Verde abacate, azeitona ou limão.
O bege cor daquele creme que você ama da sua avó.
O roxo elegante de uma beterraba.
Poucas coisas são mais bonitas que um pimentão vermelho-paixão.
É vida, acolhimento, amor, cor, melhor que pantone ou tintas Coral.
É um arco-íris ao seu redor, esperando a sorte de te colorir por dentro.
Um faber castell natural, privilégio dos dispostos a enxergarem assim.
E aí? Com que comidas você vai pintar o dia hoje?
Acha que eu posso te ajudar a enfrentar seu transtorno alimentar? Entre em contato! Sou Ellen Cocino, faço parte da Academy for Eating Disorders (AED). A Nutrição que realizo sai dos padrões habituais: busco a mudança de comportamento alimentar incentivando uma melhor relação com a comida. Trabalho diretamente com Nutrição Comportamental e Transtornos Alimentares de forma humana e gentil.